PSICOFLIX - A Série da Mente IV
- Dra. Gisele Melo
- 7 de jun. de 2019
- 4 min de leitura
Episódio 4 - Quando sofrer dói... a mente em depressão

Olhar para si e seu entorno e não encontrar o significado de nada. Olhar para a dor e perceber que ela é tão forte que não te permite sair do lugar. Pior que isso, sentir tanta dor, mesmo sem poder vê-la ou tocá-la, mesmo sem encontrar o motivo e a relação causal direta, entre ela e as circunstâncias da vida.
Ser tomado pelo lado sombrio da mente, pela escuridão d´alma, pelo abismo do vazio e da solidão. Sofrer pelo que se foi, pelo que se é e pelo que nunca foi ou não é. Olhar para os jardins coloridos vendo apenas em preto e branco, olhar para si e enxergar apenas a dor. Está é a depressão.
O cérebro deprimido é fábrica que produz em escalas industriais, pensamentos negativos e distorcidos, numa tríade matadora: passamos a olhar de forma negativa para nós mesmo, para o outro/mundo e para o futuro.
Pergunte a uma mente deprimida sobre sua autoimagem e você receberá respostas com conteúdos devastadores de desvalor, desamor e desamparo. A depressão não permite que se veja o valor próprio, as habilidades, qualidades, possibilidades e conteúdos positivos de si mesmo. Pelo contrário, ela leva a mente a culpar-se e atribuir a si, os eventos negativos, os piores defeitos e falhas, as piores frustrações e arrependimentos. A depressão busca o passado e o vasculha incessantemente, apega-se a eventos passados e compara-os com o presente. Aliás, a depressão é a doutora das comparações. Compara a tudo e a todos, porém todos tornam-se melhores que você. Ela não usa dois pesos e duas medidas, faz comparações injustas e esdrúxulas, porém, capazes de causar dor e aflição.
Ela implora pelo isolamento, passando a olhar para o mundo como uma entidade do mal. O outro não nos ama, não nos valoriza e não nos quer bem. Se recebemos elogios, estes são falsos; se temos amigos, não são tão confiáveis e talvez não nos amem. O mundo é visto pela mente deprimida da mesma forma como o indivíduo se vê.
Um destaque especial deve ser dado ao futuro. O futuro passa a ser visto como dias de desesperança, onde tudo permanecerá igual, sem graça, sem valor e sem fé; A mente depressiva não permite a visão de dias melhores ou de transformações possíveis e positivas.
Frente a tanta dor, o bem vence o mal. O lado sombrio da mente passa a dominar e ter voz ativa sobre o lado brilhante e saudável da mente; e os pensamentos e imagens produzidos por esta fábrica, passam a ser foco de atenção e apego para o nosso Eu. Fundem-se então, o Eu aos pensamentos negativos disfuncionais, levando-nos a um estado global depressivo de pensamentos dominantes, emoções advindas destes e comportamentos decorrentes dos dois primeiros. Pensa-se então: “Sou um perdedor, jamais conseguirei ter uma namorada, pois sou feio, fracassado e burro”. Os sentimentos decorrentes desta forma distorcida de pensar serão: tristeza, dor, desânimo, desesperança e impotência; levando aos possíveis comportamentos de: isolamento social, choro, procrastinação ou inação e evitação.
Assim fechamos o ciclo da depressão, onde um elemento reforça e perpetua o outro. E nesta espiral do sofrimento, chega-se ao “fundo do poço”, ao grau máximo de dor e prejuízo, culminando em ideações suicidas, pois ao buscar os sentidos e valores da vida, tudo que se encontra é a dor.
A fuga de todo o sofrer, faz o sofrimento doer ainda mais. A busca pela alegria, por dias coloridos e felizes, conforme aqueles vendidos pelos ideais sociais impostos a todos, torna-se a panaceia para a doença depressiva. Busca-se essa felicidade a qualquer custo, mesmo que para isto, seja necessário intoxicar-se com drogas lícitas, ilícitas, bens materiais, compulsões e crenças ou rituais religiosos.
A dor e o sofrimento são vistos como parte anormal da humanidade; como parte inaceitável da vivência humana, tornando-se então sentimentos que jamais devem ser aceitos ou abraçados, mas sim evitados. Contudo, o sofrer faz-se onipresente na história da humanidade e inerente a condição humana. Lutamos contra nossa própria natureza, quando não aceitamos a depressão e em vez de sua compreensão, queremos sua eliminação imediata.
As respostas para tanta dor não são vendidas em caixas, tampouco podem ser compradas. Uma boa forma de lidar com a dor e o sofrimento é a prática da autocompaixão e aceitação. Abrir os braços e estar disposto a encarar aquilo que a vida puser diante de nós. Sentir no peito, tudo que há para ser sentido, abrir espaço para os dias ruins e permitir-se ter dias ruins, sem sofrer pelo próprio sofrer.
Abraçar sua história, olhar para o passado com compreensão; abraçar os erros, as falhas, e dar amor a si mesmo acima de tudo e de todos. Levar amor para dentro de si, aceitando as imperfeições e vulnerabilidades, levará à consciência da humanidade compartilhada: há erros, imperfeições e histórias traumáticas em cada um de nós; e cada ser lida de formas diferentes com a dor.
Fixar-se no presente, escrever seus valores de vida em um papel. Imaginar-se em seu próprio funeral e pensar no que você gostaria que estivesse escrito em sua lápide. Pensar em como você gostaria de ser lembrado e o que realmente importa nesta vida. Arrisco dizer, que nenhuma de suas palavras será algo concreto ou material. Nossos valores de vida estão baseados em palavras que têm a ver com quem nos tornamos ao longo da jornada.
Ao olhar para seus valores, ao deixá-los presentes em sua vida; ao desapegar-se do passado que você agarrava com as mãos e aceitar sua história, você será capaz de segurar seu presente como uma dádiva, livre para olhar com cuidado para seus valores, aceitando aquilo que se passou e aquilo que a vida traz. Isto trará ações comprometidas com quem você se torna ao longo da jornada e aquilo que realmente é importante neste mundo.
Desta forma, o sofrimento que tanta dor traz, poderá dar lugar a uma vida que saia da escuridão e valha a pena ser vivida.
コメント