PSICOFLIX - A Série da Mente VIII

Episódio 8 - Traição

Sangrar por vários cortes que estão distribuídos por todo o corpo; sofrer com pensamentos torturantes das possibilidades imaginadas sobre o que o traidor fez; sentir como se tudo aquilo que você viveu fosse mentira...

Essas são algumas das descrições da dor da traição. São poucos os outros eventos na vida do casal, com exceção do luto pela morte e doenças, que têm uma força tão devastadora.

A sensação do traído é de ter sido apunhalado pelas costas. A revelação de uma traição é uma evisceração. Se quiser verdadeiramente ferir uma relação, arrancar seu coração, dilacerar a sua alma, a traição é uma aposta segura. A traição gera no traído o sentimento de falsidade, abandono, rejeição, humilhação, desamor, falta de cuidado e empatia; enfim, todos os monstros dos quais o amor prometeu nos proteger.

Quando uma pessoa é traída por alguém em quem confiava, seu mundo vira de cabeça para baixo. Abre-se uma rachadura na história de sua vida, a qual precisa ser recontada repetidamente para que volte a fazer sentido.

As emoções, pensamentos e sintomas desencadeados pela traição são tão prejudiciais, que atualmente, a traição é mais bem explicada pela área do trauma na psicologia. O traído pode apresentar ruminações excessivas sobre o passado, hipervigilância, acesso de fúria, torpor, pânico descontrolado e desconfiança; não surpreende podermos comparar a traição com o Transtorno de Estresse Pós-Traumático: o traído é o soldado que volta da guerra e ainda ouve os ruídos explosivos de bombas e as cenas de morte, mesmo já estando em casa.

A traição é um ataque direto a uma de nossas estruturas psíquicas mais importantes: nossas memórias do passado. Ela rouba todo o futuro, planos e expectativas do casal, além de colocar em xeque a narração da história que viveram. Isto porque como seres humanos entendemos que não é possível se controlar o futuro, mas precisamos da certeza de que o passado que vivemos seja confiável. Portanto, roubar de alguém toda a sua história, seja talvez a maior de todas as traições.

Contudo, apesar da força devastadora da experiência, a traição nem sempre culminará na separação do casal, e o trabalho do casal em terapia torna-se imprescindível. Há basicamente 3 fases que entendemos como a recuperação da crise da traição: crise, elaboração do sentido e imaginação.

O que é ou não feito na frase da crise, a primeira de todas após a descoberta, é crucial para o resultado. Nesta fase, o casal trabalhará em terapia, a clareza dos fatos (nada além do porquê o traidor cometeu o ato de traição e o que houve, detalhes não devem ser revelados), a estrutura da relação, a calmaria, o apoio e a esperança.

Na fase da elaboração dos sentidos, mergulha-se nas razões pelas quais o caso aconteceu e o papel que cada um teve na história. Finalmente, na fase da imaginação, projetam-se as possibilidades futuras para o casal, a partir de todo o trabalho feito na fase 1 e 2.

O trabalho do perdão é um dos pontos cruciais na terapia. Assim como sabemos pelo trauma, que a cura sempre começa quando o traidor admite o erro cometido. É importante que o traidor tenha paciência e apoie incondicionalmente o traído, o qual terá mudanças de humor e fúrias explosivas, desconfianças e flashbacks. Mas é igualmente importante que quem foi traído não fixe o conceito de traidor sobre seu cônjuge, pois há um ser humano por trás da traição que assim como todos nós, comete erros.

Contrariamente ao senso comum, nem sempre as traições ocorrem pelo simples prazer de enganar e trapacear. Na verdade, pessoas estão muito mais propícias a trair quando se sentem perdidas, com baixa autoestima, quando passam por perdas ou mudanças.

Então, caso você tenha sido traído, invista algum tempo em sua terapia individual pois você precisará de ajuda para passar pela dor insuportável da traição. Caso ainda pense em seu cônjuge, sugiro a terapia de casal. Mas para todos os casos de traição, as fases 1, 2 e 3 são primordiais, assim como a prática incansável do perdão.